"Uma vida desperdiçada." Volta e meia e esse sentimento me acomete. Quem nunca se flagrou fazendo algo inútil (seja do ponto de vista estético, fisiológico, intelectual e por aí afora...) e autoflagelando-se para tentar penitenciar-se de crimes e pecados imaginários ou nunca cometidos? Fato é que chega uma hora que a gente cansa. Cansa muito. E daí não sobra quase nada de forças para recomeçar, abrir uma picada nova, um carreiro novo, uma travessia imaginária possível, qual a terceira margem de Guimarães. Tem dias em que eu não acordaria e é nesses que arrumo mais o vocabulário e os olhos. É quando ignoro todas as frases bonitas que já li e que poderiam vir em meu socorro. Então fico tateando em névoa, nessa que "olho humano algum dissipa". Fico lambendo fel, fico aspirando o azul. Fico. Fico trapaceando a fúria, imaginando-me explodir em mil e um pedacinhos impossíveis de serem restaurados e apaziguando demônios reais, porque aqui, qual cavalos de pensamentos, todo dia, todo. Do sentimento de uma vida desperdiçada salvam-nos os outros. Do sentimento de uma vida desperdiçada salvam-nos os outros? Sempre eles, tão solícitos e tão ausentes, tão reais e tão impalpáveis, tão soberanos de si e tão incapazes de dizer do inefável. Mas eles, os outros dos outros e os nossos outros, nos impingem a perguntar as perguntas fundamentais. Só nós e a nossa arte nos salvam do medo de perguntar. Só nós e a nossa arte nos salvam do medo de perguntar, como é mesmo o nome do que se vive?
5 comentários:
Lagriminha...
inefável é você, minha Manoelita de Barros...
Como é o nome do que se vive, minha querida? Às vezes também sou acometida por esta dúvida...
Dey
Hi Silvia,
I see you are still blogging from time to time and visiting mine too.
Hope you are well and happy, and writing.
Carol
"Inefável", segundo um dicionário qualquer de lingua portuguesa, possui dois significados:
- que nao se pode exprimir pela palavra
- (figurado) encantador, delicioso, inebriante.
Felizmente existem tantas e outras coisas inefáveis no mundo. Talvez seja a técnica mais infalível (e mais humana possível) de tentar se procurar outras formas de comunicar o inverbalizável... e você as explica muito bem! Pela(s) arte(s), pelas trapaças, pelas aspiraçoes, pela solitude, pelas perguntas sem respostas.. E é assim que do inefável inexprimável, nasce tudo o que é encantador e inebriante.
Fazer essa transiçao já vale a pena viver cada instante!
:-)
Michèle
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