Dia desses adjetivaram-me curiosa. Nem sei. Sempre quero saber dos outros. Daquilo que os move, de seus anseios, de seus desejos, de como domam o tempo, de que coisas os arremetem ao futuro. Deve ser por isso que alguém um dia disse: “o inferno são os outros”. Sim, são os outros porque eles podem. Eles parecem infinitamente capazes. Eu, de minha parte, acho que além dos outros o inferno sou eu. Que procrastino, que sofro, que faço doer cada desilusão e contragosto. Não, eu não sei criar metáfora para falar da fúria. Não, eu não sei fazer metonímia, tampouco transparecer sentimento senão pelo modo mais infantil e tosco: às migalhas, por lágrimas e silêncio inquieto. Nada compatível com viver adultamente. Mas quem disse que lá anos fazem uma vida ser menos sôfrega. Isso, intuo, deve ter pego raiz ainda no ventre. Essa pasmaceira, essa melancolia, essa impossibilidade de buscar utopia. E é preciso quase uma vida para expurgar vãos trôpegos. Não, eu não uso fitinha de Nosso Senhor do Bonfim ou de Nossa Senhora de Aparecida. Obrigada. - Talvez devesse? - De amuletos fartei-me. Mas sim, há quem use, ainda que não acredite. Sob o argumento sedutor de “há tantas coisas que precisamos fazer e nas quais não acreditamos”. A mim bastar-me-ia poder voltar a rezar o Creio e, convencida da remissão dos pecados, começar semana nova, qual fazíamos quando crianças. Bastar-me-ia?
Quero o fel? Nada. Quero a ilusão? Quase. Quero uma vida inteira. E depois saber como vivê-la. Toda.
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