Pipoca é um grão absurdo. Desde a infância exerceu sobre mim seus poderes e mistérios. Um grão que podia ser e não ser milho. Em verdade aquelas varietais que cultivávamos tinham quase um espinho na ponta de cada grão, dificultando a tarefa de debulhá-las a mão. Mesmo assim, diferente do milho que, só quando muito jovem ou moído, mostrar-se-ia tenro e gentil, a pipoca fazia-se mais dócil e macia quando à boca.
Que os grãos estourassem, era puro nonsense. Mas a isso acresciam-se os mitos e jogos de palavras. Durante o ato de estourar pipoca nós crianças tínhamos que “por o dedo no umbigo e esperar embaixo da mesa”, diziam umas vizinhas. Tínhamos que “pensar numa fofoqueira”, diziam aquelas que não se julgavam merecedoras de tão controverso adjetivo. Tínhamos que “pronunciar repetidamente um trava-língua sentença: 'Estoura pipoca, Maria pororoca'”, durante todo o tempo até que cessassem as explosões.
Mas aquelas não eram terras de pororocas. E por que o nome de minha mãe entrava, de lambuja, no enunciado?
Gosto de pipoca, como gosto de abóbora, batata doce, cana-de-açúcar, milho verde e tudo o que remeta ao cardápio da vida no campo. Mas pipoca tem sua nobreza. Com ela se faz trocadilhos e adivinhas. Da flor à pedra inócua, cada grão porta um mistério.
Arrebentar pipoca é como viver a vida: pequenas explosões que se sucedem. Precisa-se do todo para ter uma noção do conjunto. Precisa-se da parte para não perder a noção de realidade. Nuances.
Estalar pipoca é transformar um grão em monumento.
Devora-se uma grande quantidade de pipoca para sentir-se momentaneamente completo, como de devorar ilusões se faz a vida.
Devora-se uma grande quantidade de pipoca para sentir-se momentaneamente completo, como de devorar ilusões se faz a vida.
Pipoca é fugaz como felicidade e repentina como vida.
O que é, o que é? Que pula pra cima e se veste de noiva?