Quando foi criado, no século XIX, o Passeio Público tinha o propósito, tal como tantas outras obras públicas, de atrair a atenção para seus feitores, mais do que gerar melhorias e conforto a seus usuários. Nestor Vítor, um viajante da época, aproveitava para falar dos ares urbanos que Curitiba ia ganhando “à medida que os sapos e os pobres iam cada vez para mais longe” do centro. Ele também já foi Jardim Botânico e Zoológico.
Mas hoje, e para mim, o passeio é palco de múltiplas anedotas. Gozado o nome precisar conter em si a ideia de público. Soa quase tão paradoxal quanto aquela iniciativa que havia um tempo atrás chamada “teatro para o povo”. Ora, se não o povo, quem vê o teatro? Para quem é o teatro? Então para quem é o passeio se não para seu público? E o que fazemos quando vamos à passeio se não dar a ver a nós mesmos? Estamos sempre na esfera pública (e a passeio?) tão logo deixemos o recinto privado (isso quando os vizinhos e seus sons potentes e seus pets não invadem esse que deveria ser nosso reduto inviolável).
Eu acho que as árvores do Passeio têm soberania. Eu vivi a finitude de uma delas outro dia, pois que foi tragada pelo vento. Ela estava bem bonita ao chão, como só pode ser bonita uma árvore adulta e gigantesca. Aliás, queria vê-la assim em uma mata. Teria ela cumprido seu destino? Se me ressenti? Porque tenho amor nelas, por frequentá-las. Eu sei de muitos pássaros que ali vão amiúde e ninam e zelam a prole, enquanto renovam seus genes. Mas é avassalador quando um deles, ainda com corpinho de parcas pluma, estatela-se cá em baixo.
Eu também me amuo quando vejo as prostitutas chorando. Outro dia uma delas, nem tão bonita, chorava um choro comedido e constante.
Eu penso no Passeio como um museu a céu aberto, um pátio, um canteiro de obras, um chão de fábrica. Ali estão todos, as crianças em seu deslumbramento diante de tucanos, gralhas-azuis, pavões, trinca-ferros, pelicanos e cotias. As mulheres que fazem dele seu espaço e trabalho. Os homens sedentos de algum afeto e sacanagem. Os acadêmicos exaustos de pensar. Os sozinhos/desocupados/velhinhos/boêmios e nem tanto, limando trias, baralhos e cavalos ao xadrez. Aqueles que se acham normais e aqueles que não sabem muito bem quem são, mas, vez ou outra procuram saber. Ou não.
Se o frequentarmos ao término de um dia é provável que nos deparemos com aquele homem, (cujo nome burocrático da profissão eu ignoro, um cuidador de animais?), parcimoniosamente a carregar a tartaruga para o abrigo. Eu adoro ver aquela tartaruga de pernas para o ar sendo levada tão vagamente. Acho que ela nunca tenta esticar o pescoço enquanto ele lhe resume o trajeto.
É isso. Eu tenho cá pra mim que o Passeio me amplia e engrandece.
Então, vamos ao Passeio.