terça-feira, 2 de março de 2010

Homenagem

       Li, dias atrás, esse poema que julguei ser perfeito para mim e para aqueles meus iguais no amor aos livros. Bom, hoje eu quis oferecê-lo, como homenagem, ao bibliófilo José Mindlin.

       ODE AMATÓRIA
                       Poema de Alexei Bueno

Meus livros amados,
Como trepadeiras
Sobem, apinhados,
Paredes inteiras.


Alargam seus flancos
Por cômodos, quinas,
E erguem-se em barrancos
Fabricando esquinas.


Lombadas, brochuras
Me olham das estantes,
Marroquins, nervuras,
Discretos, berrantes,


E neles me espiam
Gregos e sumérios,
Almas que extasiam,
Monstros deletérios.


Quinze mil amantes,
Bem embaixo, em cima,
Livro, o agora e o antes,
Palavra sem rima.


Que vida haveria,
Reles, pouca, porca,
Sem tal companhia,
Taça que se emborca.


Fólios, incunábulos,
Línguas e cidades,
Semblantes, vocábulos,
Desastres, vaidades,


Bulas, manuscritos,
Toda a espécie humana
Em grilhões escritos
Numa caravana


Que cruza o deserto
Nosso, soledade,
O longínquo, o perto,
O agora, a saudade,


De mãos dadas, nisto,
Filho, pai e avô,
Juntos Jesus Cristo
E o Doutor Petiot.


Sarabanda estática,
Vertical loucura,
Viagens, numismática,
Budismo, pintura,

E os autores todos,
Vivíssimos, mortos,
Ancestrais rapsodos,
Místicos absortos,


E entre os que pisaram
Nas poentas paragens
Os que em almas aram,
Tipos, personagens,


Todos, todos juntos,
E os florões, e espelhos,
Colofões defuntos,
Frontispícios velhos...


Que teria eu sido
Sem tal ebriedade,
Meu portão fendido
Para a eternidade,
       Para o imenso, a viagem
       Da alegria humana,
       Sem mais dor, voragem
       Que nos unge e irmana?

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